A agonia dos cristãos do Iraque é interminável. Na igreja de Nossa Senhora da Salvação, no bairro central de Karrada, em Bagdá, 52 pessoas morreram – a maioria entre a centena de fieis reunidos para a missa dominical – quando a polícia invadiu o templo em uma arriscada operação de resgate para liberá-los de terroristas. Sete agentes, e cinco sequestradores estão entre os mortos – outros três sequestradores foram presos. Os dados eram imprecisos ontem porque várias das 70 pessoas que ficaram feridas estavam em estado grave.
Esta igreja, que já foi atacada em 2004, é uma das mais populares de Bagdá. Tem um jardim descuidado com uma gruta da Virgem, um andar superior com o escritório do pároco e terraços que conduzem ao nível superior onde está o altar. Pertence à comunidade siríaca católica, a terceira mais importante do país.
Em um comunicado divulgado pela internet, o grupo denominado Estado Islâmico do Iraque, vinculado à Al Qaeda, assumiu a responsabilidade pelos cem reféns. Exigia a liberdade de todos os seus integrantes presos nas cadeias do Iraque e também do Egito, com ênfase no caso de duas mulheres muçulmanas retidas em um monastério copta do Egito. Afirmaram na mensagem que os cristãos iraquianos seriam "exterminados" se as mulheres não fossem libertadas.
O ministro da Defesa, que faz parte do governo que está deixando o poder, já que ainda não se conseguiu formar um novo gabinete no país, decidiu tomar a igreja depois de horas de inúteis contatos com os terroristas. "Era impossível esperar mais tempo porque os terroristas queriam assassinar a muitos de nossos irmãos sequestrados", disse o general Abdu Qadr al Obeidi.
Os agentes, que haviam cercado o templo, conduziram a invasão, convertida numa carnificina. Os terroristas e os policiais se enredaram em disparos em meio aos fieis sequestrados. Desta vez, o exército dos Estados Unidos, que fez sua retirada formal no verão passado, não foi visto nas redondezas da igreja.
Segundo o ministro, a interceptação de chamadas dos celulares dos terroristas dá a entender que não havia iraquianos entre os sequestradores. Muitos deploraram a forma como se consumou este resgate tão sangrento.
A igreja era notoriamente mal vigiada. Quando a visitei, recentemente, pude estacionar com facilidade junto ao portão, onde havia apenas um policial. O padre, assassinado assim que os terroristas entraram no templo, foi prudente na ocasião ao responder minhas perguntas sobre a situação de angústia em que viviam os cristãos desde a queda de Sadam Husein. Não quis fazer nenhuma acusação.
Em 2008, os ataques contra cristãos de diversos ritos custaram a vida de 40 pessoas e provocaram um novo êxodo na cidade de Mosul. A nova Constituição reconhece os direitos de culto e ensino, mas estabelece também que "nenhuma lei poderá ir contra as regras do Islã". Ainda que a presença dos cristão seja muito anterior a dos muçulmanos, eles ficaram expostos aos defensores da jihad, que os consideram simpatizantes do Ocidente.
Essa comunidade, vinculada por suas crenças ao Ocidente cristão e por sua comunhão cultural com o Oriente muçulmano, sofre há décadas com as guinadas da história contemporânea. Depois deste atentado, o êxodo deve aumentar ainda mais. Há duas décadas havia 1 milhão de cristãos no Iraque. Hoje, eles estão reduzidos à metade disso.
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