O juiz Renato Luís Dresch, da 4ª Vara de Fazenda Pública Municipal de Belo Horizonte, indeferiu um pedido de alvará, feito pelo Hospital Odilon Behrens, que pediu autorização para fazer uma transfusão de sangue em uma paciente que pertence à Igreja Testemunha de Jeová. O magistrado considerou que o pedido envolve valores constitucionais que necessitam de avaliação prudente, sob pena de institucionalizar-se uma relação ditatorial entre o Estado e o cidadão.
A paciente, por motivos religiosos, não aceita a transfusão, mesmo ciente do risco de morte. O hospital salientou que os profissionais não podem ficar inertes diante do risco de morte, pois, após passar por uma cirurgia, a religiosa apresentava queda progressiva de hemoglobina.
Para o magistrado, as autoridades públicas e o médico têm o poder e o dever de salvar a vida da paciente, desde que ela autorize ou não tenha condições de manifestar oposição. “Entretanto, estando a paciente consciente, e apresentando de forma lúcida a recusa, não pode o Estado impor-lhe obediência, já que isso poderia violar o seu estado de consciência e a própria dignidade da pessoa humana”, ponderou.
O juiz frisou, também, que as Testemunhas de Jeová não se recusam a submeter a todo e qualquer outro tratamento clínico. A restrição refere-se a qualquer tratamento que envolva a transfusão e, especialmente, quando existem outras formas alternativas de tratamento.
No seu entendimento, resguardar o direito à vida implica, também, “em preservar os valores morais, espirituais e psicológicos”. O magistrado esclareceu que o direito à vida está assegurado na Constituição Federal, de modo que não é lícito à parte atentar contra a própria vida. Porém, ressalvou que a Constituição, em seu art. 5º, inciso IV, assegura, também, a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, garantindo o livre exercício dos cultos religiosos.
O juiz ainda salientou que o recebimento do sangue pelo seguidor da corrente religiosa “o torna excluído do grupo social de seus pares e gera conflito de natureza familiar, que acaba por tornar inaceitável a convivência entre seus integrantes”.
Por estas razões e pela informação de que a paciente está em absoluto estado de consciência, o juiz não autorizou a realização da transfusão, que está sendo recusada em razão de fundamento religioso. “Desta forma, tratando-se de pessoa que tem condições de discernir os efeitos da sua conduta, não se lhe pode obrigar a receber a transfusão”, concluiu o juiz.
Ao fundamentar sua decisão, Dresh citou outras decisões do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que preservaram o direito de seguidores da religião em não passarem por transfusões de sangue. Em uma das deciksões do TJMG ficou decidido que é “possível que aquele que professa a religião denominada Testemunhas de Jeová não seja judicialmente compelido pelo Estado a realizar transfusão de sangue em tratamento quimioterápico, especialmente quando existem outras técnicas alternativas a serem exauridas para a preservação do sistema imunológico”.
Outra decisão considerou que a recusa do paciente “em submeter-se à transfusão de sangue é providência legítima desde que não esteja inconsciente e possua condições de externar juízo de valor sobre os procedimentos necessários à conservação de sua vida.”
A decisão ainda está sujeita a recurso.
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