Manobra adia votação de proposta sobre "cura gay"
Um pedido de vista do deputado Simplício Araújo (PPS-MA) adiou mais uma vez a votação do projeto conhecido como "cura gay" na ce Minorias da Câmara dos Deputados, presidida pelo deputado Marco Feliciano (PSC-SP).
A proposta susta artigos de uma resolução do Conselho Federal de Psicologia que proíbem os psicólogos de propor a "cura" da homossexualidade a pacientes. A suspensão está prevista no Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 234/11, do deputado João Campos (PSDB-GO).
O relator na Comissão de Direitos Humanos, deputado Anderson Ferreira (PR-PE), leu seu parecer nesta terça-feira (4), recomendando a aprovação do projeto. A comissão já tentou votar o texto - conhecido como projeto da "cura" gay - quatro vezes, sem sucesso.
Segundo Feliciano, o projeto deve voltar à pauta da CDH daqui a duas sessões.
Depois de ver que mais uma vez a votação do assunto fora adiada, Marco Feliciano criticou o tratamento da imprensa, inclusive da própria Casa Legislativa, em relação ao teor do projeto. "Como é que a Agência Câmara, feita por pessoas que trabalham aqui dentro, provoca na sociedade esta celeuma? As pessoas pedem para mim uma injeção para curar gay", disse.
O deputado defende que a proposta "traz o beneficio do direito humano da pessoa escolher o que ela quer" no sentido de procurar ajuda de psicólogos, caso esteja "infeliz por ser homossexual".
"Ninguém cura ninguém, quem se cura é você mesmo quando você aceita ser administrado por uma palavra de fé. Não é o medico que vai fazer isso, não é o psicólogo. É a pessoa, se a pessoa está sofrendo, ela tem que lutar por isso [cura] mesmo", acrescentou a deputada Liliam Sá (PSD-RJ), em apoio à avaliação de Feliciano.
Diferentemente de todas as outras reuniões da comissão neste ano, não houve manifestações de populares nem a favor nem contra o presidente da comissão. Na sala da comissão estão presentes apenas deputados, assessores e profissionais da imprensa.
Frente parlamentar paralela
Em paralelo à comissão, a Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos promoveu uma votação simbólica contra a votação da matéria. O ato, que só tem efeito político, teve a participação de cinco deputados – Érika Kokay (PT-DF), Jean Wyllys (PSOL-RJ), Luiz Couto (PT-BA), Domingos Dutra (PT-MA) e Marina Santanna (PT-GO), que fizeram questão de demonstrar sua contrariedade com o tema.
Durante a votação, os presentes levantaram cartazes com os seguintes dizeres: "Não ao obscurantismo" e "Não ao retrocesso".
"Nós tínhamos a preocupação que algumas aberrações fossem aprovadas na comissão formal na comissão de Direitos Humanos, sem deixar que acontecesse a sinalização que esta Câmara tivesse outros setores que aquilo apresentaria uma aberração. Fomos informados que a comissão, felizmente anda um pouco inoperante, e um de seus membros pediu vistas ao projeto de cura gay", justificou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), que abriu a audiência, mas teve de sair antes da votação.
Além dos parlamentares, a reunião foi marcada pela participação da psicóloga Cynthia Ciarallo, conselheira do Conselho Federal de Psicologia. Ela reafirmou contrariedade à matéria, classificou como "retrocesso" o projeto no que se refere ao respeito à diversidade no país e destacou que nem Psicologia nem a Medicina no país tratam o homossexualismo como doença.
"Temos muita clareza de que a homossexualidade não é uma questão de doença, a orientação sexual é algo pertinente ao processo indenitário do sujeito. De maneira alguma, não há nenhuma restrição [no atendimento aos homossexuais por parte dos psicólogos]", afirmou a conselheira. "A gente [os psicólogos] não tem controle sobre a vida das pessoas. Há uma fantasia de que se ter o controle sobre as possibilidades do sujeito", completou.
A psicóloga destaca que as resoluções do órgão estipulam também que o profissional também não pode se manifestar publicamente sobre a questão como se tratasse de uma doença. "Ele está proibido sim. Existe um código de ética, que estabelece o princípio do direito à diversidade", resumiu.
Histórico de cancelamentos
No último dia 29 de maio, a reunião da comissão foi cancelada porque os parlamentares faziam um "esforço concentrado" para votar em plenário duas MPs (Medidas Provisórias) que perderiam a validade, mas que acabaram não sendo apreciadas pelo Senado.
Na sessão anterior marcada para o dia 22, Feliciano (PSC-SP) não compareceu ao Congresso para se recuperar de uma virose, segundo sua assessoria.
Os outros dois cancelamentos ocorreram devido à discussão da MP que regulamenta o setor portuário que mobilizou todos os deputados no plenário da Câmara e, na reunião anterior, foi o presidente da Casa Legislativa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) que pediu que a reunião não fosse realizada.
Desde que assumiu a presidência da CDH (Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Feliciano tem sido alvo de protestos de ativistas que o acusam de racismo e homofobia por declarações que deu. Ele também tem recebido o apoio de evangélicos que manifestam publicamente seu apoio ao parlamentar, que se diz vítima de preconceito por ser evangélico.
Sobre o projeto
O projeto de decreto legislativo nº 234 de 2011, do deputado João Campos (PSDB-GO), pretende permitir a "cura gay". O projeto visa derrubar dois artigos da resolução 1/ 1999 do Conselho Federal de Psicologia. Campos argumenta que o conselho restringiu o trabalho dos profissionais e o direito das pessoas de receberem orientação profissional, por intermédio de ato normativo, que "extrapolou o seu poder regulamentar".
O Conselho Federal de Psicologia defende que a "homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão". Por isso, o profissional poderá tratar normalmente de um homossexual sem que o tema seja tratado como doença.
Já para Campos, "o Conselho Federal de Psicologia, ao criar e restringir direitos mediante resolução, usurpou a competência do Poder Legislativo, incorrendo em abuso de poder regulamentar, com graves implicações no plano jurídico constitucional".
A proposta tem apoio do relator, o deputado Anderson Ferreira (PR-PE), que, desde 26 de abril, já está com o relatório pronto para a votação do projeto na CDH.
Se aprovado na comissão, o texto deverá ser votado em outras duas comissões permanentes da Câmara antes de ir ao plenário – a de Seguridade Social e a de Constituição e Justiça. Após o plenário da Câmara , será analisado pelo Senado. Caso tentem apressar sua votação, os líderes partidários poderão apresentar um pedido de urgência – o que permitiria que a matéria fosse direito votada em plenário. No entanto, precisariam do apoio de 257 deputados para fazer o pedido e mais mesmo número de deputados para aprova-lo em plenário.
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