A mãe homossexual que acaba de ter reconhecido na Justiça de São Paulo o direito de registrar os dois filhos gerados a partir de óvulos doados por sua companheira comemorou a decisão do Conselho Federal de Medicina (CFM) que, nesta semana, determinou que casais homossexuais tenham direito de acesso a técnicas de fertilização.
Adriana Tito Maciel deu à luz duas crianças em abril de 2009, após receber óvulos doados por sua companheira, Munira Kalil El Ourra. Os óvulos foram submetidos a fertilização in vitro. Mas só agora o casal homossexual obteve o direito de mudar a certidão de nascimento dos filhos para incluir no documento o nome da segunda mãe. A sentença judicial saiu coincidentemente na mesma semana em que o CFM divulgou a nova regra médica.
“Achei o máximo. No nosso caso, recorremos a este método e encontramos muitos casais que estão recorrendo. Acho que o Conselho Federal de Medicina não faz mais do que sua obrigação, porque todos temos direito. Agora, tendo reconhecimento deles também, facilita muito para os casais, que tinham muitas dúvidas e sofriam muito preconceito”, afirmou.
Especialista em direito homoafetivo, a advogada de Adriana, Maria Berenice Dias, também comemorou a decisão da Justiça paulista e a nova determinação do CFM. “A resolução do conselho diz que qualquer pessoa pode utilizar essas técnicas. Antes falava que era só o casal. Com certeza foi uma evolução. Em primeiro lugar, muitas clínicas estavam fazendo. Isso estava impondo que as pessoas mudassem de estado para fazer a fertilização. Com isso, quebra a resistência dos laboratórios particulares e públicos”, afirmou.
Maria Berenice, no entanto, está preocupada com o que percebe como uma tendência. Para ela, o rigor dos juízes e as duras regras para adoção de crianças no país contrastam com a facilidade cada vez maior obtida pelos casais, heterossexuais ou não, às técnicas de reprodução assistida, cada vez mais baratas e de mais fácil acesso. Resultado: um contingente cada vez maior de crianças aptas para adoção abandonadas em abrigos país afora. “A lei assusta e as pessoas estão desistindo e fazendo filhos. É uma caça às bruxas, uma lei muito perversa. Há uma insistência na ideia de que o local da criança é a família biológica. Não é. Pai e mãe é quem cria e quem embala, quem a criança conhece. Precisa acabar com essa burocracia horrível”, afirmou.
Decisão
No início dessa semana, o juiz da 6ª Vara de Família e Sucessões de Santo Amaro, na Zona Sul de São Paulo, concedeu a Adriana e Munira o direito de registrar os filhos com dupla maternidade. Adriana recebeu os óvulos de Munira, que se submeteu a inseminação artificial. As crianças estão registradas provisoriamente apenas com o nome da mãe biológica. Assim como ocorre em todos os casos de fertilização, o nome do pai biológico, doador do material genético, não aparece na certidão de nascimento.
Com a concessão do mandado de averbação, que permitirá retificar o registro de nascimento, Adriana e Munira poderão procurar o cartório para fazer constar do documento os nomes das duas mães e dos quatro avós maternos das crianças.
“A gente espera por isso há dois anos e foi a melhor notícia. Vamos esperar por 15 dias para ver se haverá recurso e depois vamos poder fazer a tão sonhada certidão, com o nome da Munira”, disse Adriana. Para ela, a decisão significa muitas conquistas para as crianças em termos de cidadania. “Dentro de casa não muda nada. As crianças nos chamam de mãe. Com a dupla filiação, elas passam a ser beneficiárias de tudo o que eu tenho e de tudo que a Munira tem e terão direito a tudo, igual a filhos de casais héteros”, afirmou. Emocionada, ela agradeceu às advogadas Maria Berenice e Viviane Girardi, que atuaram no caso.
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