Bektas Erdogan nunca esperou que sua fé cristã de onze anos prejudicaria sua carreira como desenhista de moda, na Turquia.
Contratado, há cinco meses, por uma companhia de Designer de Jeans, em Beyazit, um bairro de Istambul, Erdogam teve a garantia de seu chefe muçulmano que seria avaliado levando-se em conta o seu trabalho, não a sua religião.
Após sua primeira coleção ser vendida com muito sucesso na Rússia, Erdogan recebeu um telefonema do seu patrão pedindo a ele que viesse trabalhar em um domingo à tarde. Erdogam imaginou que talvez houvesse um jantar surpresa na companhia.
Mas, naquela noite, na loja, seu supervisor raivosamente acusou-o de fazer "trabalho missionário" e "lavagem cerebral". Com a ajuda de dois empregados e um parente, ele espancou Erdogan por duas horas. Os homens golpearam repetidamente a cabeça e o rosto do desenhista com socos e a coronha de uma pistola. Três vezes o chefe de Erdogan tentou atirar nele, mas a arma falhou.
"Ele realmente queria me matar. Não era só um susto", declarou Erdogan, que contou ao Compass que orou por socorro e meditou em versículos bíblicos, enquanto seus agressores ameaçavam assassiná-lo e esconder seu corpo.
Seus colegas de trabalho libertaram Erdogan, 32 anos, com o rosto inchado e ensangüentado, por volta das 21 horas, advertindo-o de que eles poderiam matá-lo mais tarde. Depois disso, ele já recebeu três telefonemas anônimos ameaçando sua vida.
Erdogan não prestou queixa do incidente de 7 de agosto à polícia, temendo que seu chefe, em conluio com os oficiais locais, pudesse torná-lo vítima de novas agressões. Ele também acha que, uma vez que a polícia descobrisse que é um cristão, eles teriam má vontade em ajudá-lo.
Ele acredita que a raiva do patrão é proveniente do interesse dos empregados da loja pelo cristianismo. Durante os últimos três meses dele no trabalho, Erdogan disse que "quase todas as refeições (no trabalho) tornavam-se uma sessão de perguntas e respostas sobre minha religião"
Violência de Policiais à Paisana
Erdogan não é a única vítima, do crescente e evidente, sentimento anticristão que há no cerne da sociedade turca. No mesmo dia em que ele foi atacado, a polícia de Istambul espancou dois protestantes convertidos, de cerca de 20 anos, e disseram-lhes que eles não poderiam ser as duas coisas: turcos e cristãos.
Umit e Murat-Can, que pediram para ter seus sobrenomes omitidos, estavam a caminho de uma das 25 igrejas protestantes de fala turca, em 7 de agosto, quando viram o americano David Byle e sua filha de três anos cercados por uma pequena multidão de policiais e civis.
Byle estava exercendo o direito legal de distribuir folhetos cristãos, na Istiktan Caddesi, uma das principais vias públicas para pedestres em Istambul, quando dois policiais à paisana aproximaram-se dele. Um deles agarrou seu queixo e gritou com ele por estar distribuindo literatura cristã, atraindo rapidamente uma multidão de policiais e transeuntes.
Quando os dois cristãos tentaram intervir em favor de Byle, a quem eles reconheceram como um membro de uma igreja local, ocorreu inesperadamente uma luta corporal entre Umit e um dos policiais à paisana.
Segundo o relato de Murat-Can, cerca de 15 policiais forçaram Umit a deitar-se no chão, onde eles o chutaram e lhe deram pancadas, algemando-o e levando-o para o interior de um edifício próximo dali.
"Logo percebi que eles eram policiais", declarou Umit, cujo agressor não se identificou como um policial.
O policial espancou Umit por três minutos antes de levá-lo à delegacia de polícia com Murat-Can que o tinha acompanhado no meio do grupo.
"Eles não nos mostraram nenhuma identificação nem leram os nossos direitos", declarou Murat-Can, que descreveu ao Compass as horas seguintes passadas na delegacia de polícia. Após terem encontrado 100 folhetos cristãos na mochila de Murat-Can, os policiais acusaram os jovens de ser missionários determinados a "dividir a Turquia".
Apesar de tudo libertaram-nos sem registrar nenhuma queixa formal, e os policiais disseram aos rapazes que eles não poderiam ser turcos e cristãos.
Em um outro incidente no mês passado em Eskisehir, a 193 quilômetros milhas a sudeste de Istambul, três desconhecidos assaltaram o protestante Salih Kurtbas. Eles o atacaram pelas costas às 18 horas. Ele estava ali porque haviam solicitado, por um telefonema anônimo, que ele viesse para discutir sobre cristianismo.
Pouco tempo depois de ter chegado em casa com o nariz ensangüentado, lábios cortados, olhos negros e a orelha inchada, ele recebeu um telefonema irado de seus agressores.Eles o acusavam de ser um missionário ativista e ameaçaram matar qualquer um que se associasse com um empresário americano local, do qual, há uma alegação de que esteja espalhando propaganda cristã.
Os evangélicos de Eskisehir têm enfrentado constantes obstáculos na obtenção de permissão legal para começar a primeira igreja protestante da cidade. "Nós apelamos para o governador e não recebemos nenhuma resposta, e o governo municipal tem nos dito que a construção não está de acordo com as normas de segurança contra terremotos. Todas estas coisas vêm para piorar!", declarou Kurtbas.
Kurtbas sequer tem intenção de ir à polícia e explica que se eles descobrirem que ele é cristão, nada de bom advirá disto. Umit também quer evitar novos problemas com as autoridades, temendo que os procedimentos legais possam prejudicar a possibilidade do irmão dele de entrar na Academia de Polícia.
MEDO DO TRIBUNAL
"Esses tipos de ataques não estão me surpreendendo", admite Orhan Kemal Cengiz, consultor legal da Aliança das Igrejas Protestantes da Turquia (Turkey"s Alliance Protestant Churches-APC). "Eu estava esperando por eles... Os cristãos deveriam levar isto a sério.
Com conversações agendadas para 3 de outubro para a entrada gradual na União Européia, a Turquia está tentando melhorar sua imagem no que diz respeito aos direitos humanos.Um pacote de reformas legais, aprovado em junho, reafirmou a liberdade religiosa, instituindo três anos de prisão para qualquer um que impeça a expressão de crença religiosa.
Mas, a União Européia tem estado cética, desafiando, oficialmente, os 99% da Turquia Muçulmana a implementar a liberdade religiosa entre as comunidades minoritárias não-islâmicas.Pouco menos de 100.000 cristãos seguem as antigas tradições cristãs dos armênios, gregos e Igrejas ortodoxas Sírias, que são exclusivamente congregações étnicas.
Em contraste, a emergente comunidade protestante turca, estimada em 3.500 adeptos, contesta a secular e antiga idéia de que ser um turco é ser um muçulmano.
Nos últimos dez meses a violência contra os protestantes cristãos na Turquia tem sido publicamente visível. O ex-embaixador americano na Turquia, Eric Edelman, fez representações formais junto aos oficiais de Ankara, em abril, e outra vez em junho, em relação a dez incidentes.
"A Turquia não está a par da gravidade dos problemas", diz Cengiz. "Alguns oficiais têm boas intenções, mas eu tenho uma forte suspeita de que eles realmente não entendem as questões de liberdade religiosa".
Enquanto mais protestantes turcos continuam relutantes em levar suas causas ao tribunal, por temerem novas perseguições, outros acham que a igreja pode ganhar as ações legais de agressão, sem minar sua mensagem de amor.
"Eu sou um grande entusiasta da abertura de inquéritos judiciais", declarou ao Compass Isa Karatas, porta-voz da APC. "Quando nós olhamos as coisas sob a perspectiva de um cristão, naturalmente precisamos ser perdoadores. Mas isto não é um obstáculo para procurarmos os nossos direitos".
Cengiz, o consultor legal da APC, também recomenda que as vítimas de abusos devam ir até o tribunal para se protegerem. "Se você não registrar a causa contra a polícia, você pode encontrar-se ante um tribunal e até mesmo na cadeia, mesmo que seja você a vítima de má conduta policial. As leis turcas forçam frequentemente as vítimas de abusos a moverem ação judicial, via de regra para proteger os policiais de instaurações de processo contra eles".
Líderes da Igreja Protestante Turca abriram sete processos por calúnia e difamação, este ano, contra três emissoras de TV, para combater acusações veiculadas nacionalmente. As declarações dos programas de televisão alegavam que cristãos locais espionam para governos estrangeiros, que pagam turcos para mudar de religião.
Diante da retórica anticristã de alguns oficiais do governo e dos últimos ataques contra os protestantes, muitos cristãos turcos admitem que eles não estão esperando que o governo ou a sociedade mude da noite para o dia.
"Há um segmento do governo que apóia sentimentos anticristãos, mas ao lado deste segmento há um grande segmento que se opõe a isto", declarou Karatas da APC ao Compass. Ele disse que os cristãos que sofreram perseguições por suas crenças "deveriam abrir processos judiciais, visto que, eu acredito que eles receberiam apoio do governo".
"Na teoria nós temos um ambiente livre", declarou Umit à Compass, dez dias depois de ter sido espancado por policiais. "Eu não penso que há um problema com o Estado. Mas o povo turco ainda não entendeu o que é democracia. Eles ainda vêem o Estado como um pai. Eles não sabem o que significa servir. Por isso, quando as pessoas que trabalham para o Estado, dizem alguma coisa ruim sobre os cristãos, o povo acredita nisso".
A despeito das contínuas ameaças de morte, Erdogan não planeja deixar o país. Quando indagado, de como ele se sente em relação à perda de seu emprego, a um severo e contínuo espancamento e de ter sido ameaçado de morte - tudo em uma noite - ele sorriu. Ainda que a situação dele não melhore, ele declarou: "Deus me disse para regozijar, porque Ele pode trazer glória para Seu nome".
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