Dois peruanos, um deles um evangelista católico, tiveram de ir para esconderijos depois que a Corte Penal do Peru ordenou que eles fossem presos outra vez por crimes terroristas dos quais a mesma corte os havia absolvido há menos de um ano.
Wuille Ruiz, da Associação Paz e Esperança, um grupo evangélico de assistência legal sediado em Lima, que defende os dois homens, disse que não surgiu nenhuma nova evidência que pudesse justificar o ato da corte. Ruiz acredita que a medida seja uma reação insensata da ofensiva do país na "guerra ao terrorismo".
As autoridades inicialmente prenderam Augusto Camacho Alarcón, 45, e Carlos Aberto Jorge Garay, 33, em bairros diferentes no dia 23 de julho de 1992, tendo apenas evidências circunstanciais contra eles.
Augusto Alarcón, um operário da construção civil da aldeia andina de Apurimac, estava atravessando uma rua em Lima quando alguém próximo atirou uma bolsa contendo cerca de cinco quilos de explosivos. A polícia o prendeu e, um tribunal anônimo, do qual não se conhece a identidade do juiz, negou a ele qualquer defesa. A corte o condenou sem ter nada além de "evidências" contra ele, e o juiz o sentenciou à prisão perpétua. Augusto Alarcón sofre de tuberculose que contraiu na cadeia pública Castro Castro, em Lima.
As autoridades prenderam Jorge Garay, operário de uma fábrica, a seis quarteirões de sua casa na aldeia andina de Ancash, por onde caminhava quando rebeldes do Sendero Luminoso explodiram um ônibus. Em circunstância parecida com a que Augusto Alarcón foi condenado, um tribunal anônimo considerou-o culpado, apesar da falta de evidências contra ele. A corte sequer considerou que em 1989 os rebeldes do Sendero Luminoso mataram o pai de Jorge Garay, um líder da comunidade Ancash que servia o exército peruano.
A corte sentenciou Jorge Garay a 25 anos de prisão. Ele cumpriu a pena em Castro Castro, onde trabalhou como cozinheiro e tornou-se um servo fiel de Cristo através do discipulado de Saul Tito, um prisioneiro evangélico que também foi falsamente acusado de terrorismo. Professor de trigonometria, Tito foi preso quando a escola em que ele lecionava tornou-se suspeita de abrigar uma célula de colaboradores do Sendero Luminoso.
Tito recebeu uma sentença de 20 anos de prisão, mas ele tinha cumprido pena apenas três anos antes da Comissão Ad Hoc, instituída em agosto de 1996, para examinar os casos daqueles que alegavam ter sido condenados injustamente por terrorismo, libertando-o em outubro de 1996. O então presidente Alberto Fujimori admitiu que suas medidas contra os terroristas tinham aprisionado pessoas inocentes e a Comissão Ad Hoc tinha poder para libertar aqueles que foram condenados com base em pequenas ou nenhuma evidência, sujeitando-se ao veto presidencial.
Durante o tempo na prisão, Tito levou muitos prisioneiros a Cristo.
Contudo os observadores dos direitos humanos e advogados da Paz e Esperança afirmam que as prisões do Peru permanecem lotadas de pessoas que foram injustamente condenadas por crimes de terrorismo, e que poucos prisioneiros foram libertados desde que o Congresso peruano dissolveu a Comissão, no final de 1999. A Anistia Internacional adotou Jorge como "prisioneiro de consciência".
A Corte Nacional do Peru reviu o processo de Augusto Alarcón e Jorge Garay e considerou que os dois tinham sido condenados injustamente. Cada um deles passou mais de 12 anos na prisão. A corte libertou Camacho em 26 de outubro de 2004, e uma semana depois libertou Jorge Garay. Depois, a Suprema Corte derrubou as decisões judiciais das cortes penais, entretanto, uma instância inferior ordenou a "recaptura" dos dois homens no dia 24 de junho.
"Não que haja novos elementos ou evidências" no caso, afirmou Ruiz. Enquanto casos sérios de terrorismo são rotineiramente revistos, Ruiz disse que não está certo sobre o motivo que poderia ter desencadeado a ordem.
Mesmo para Ruiz, que é acostumado a lidar com as freqüentes arbitrariedades do sistema judicial peruano, o desenrolar dos fatos desafia a lógica. "Isso é algo que eu não entendo muito bem", disse ele. "Na realidade, os juizes não examinam muito esses casos nem determinam se há evidências ou não contra eles".
Ruiz disse que a Suprema Corte possivelmente questione decisões judiciais em outros casos de prisioneiros injustamente acusados de terrorismo por causa da preocupação de que o Sendero Luminoso possa se reestruturar. As autoridades temem que o Sendero Luminoso desencadeie uma onda de terrorismo como fez, junto com o Movimento Revolucionário Tupac Amaru, entre 1980 e o início da década de 1990.
"Existe aqui uma situação de terror, de choque, algo que nunca tem fim", disse Ruiz.
Os advogados da Paz e Esperança encaminharam uma campanha de conscientização relativa a cada caso, ele disse, e pediram que a corte permita que Augusto Alarcón e Joge Garay permaneçam livres enquanto os casos estiverem sendo revistos.
Ainda que não haja estatísticas exatas disponíveis sobre os números de cristãos acusados injustamente, Ruiz afirma que desde que a Paz e Esperança começou a defender esses casos em meados de 1980, cerca de mil evangélicos foram absolvidos ou perdoados de crimes que eles não cometeram.
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