O egípcio Mohammed Ahmed Hegazy se tornou o primeiro muçulmano de nascimento a mover uma ação judicial para que seu documento de identidade indicasse sua nova fé.
Ele se ariscou ao sair de casa, numa tarde quente de agosto, para conversar com a agência de notícias Compass (leia a primeira parte da entrevista aqui). No restaurante, olhava nervosamente para os lados para ter certeza de que não era seguido.
O que Hegazy queria realmente conversar era a respeito da situação de milhares de convertidos em seu país que sofrem discriminação por parte do Estado, da família e até mesmo das igrejas locais, disse ele, porque a Constituição do país está fundamentada na sharia (lei islâmica).
Hegazy não mede as palavras quando o assunto é o que ele chama de incapacidade da Igreja de enfrentar as forças do governo e a sociedade islâmica para defender os direitos dos convertidos.
“A Igreja no Egito é impotente e covarde” – disse ele, mencionando os líderes que não se levantam pelos direitos religiosos, não evangelizam e nem batizam os convertidos.
Ele citou o bispo copta Bishoy, que disse que sua igreja é contra o proselitismo e a propagação do evangelho, e afirmou que a Igreja copta não faz isso. As igrejas coptas no Egito – ortodoxas, católicas e evangélicas – alegam publicamente não batizar convertidos, e acusam umas as outras de fazer isso, embora se saiba que padres e pastores batizam secretamente para não provocar reações violentas por parte dos muçulmanos e do governo.
“O padre que me batizou não quis me ver por um ano inteiro” – disse Hegazy. “Ninguém se levanta para dizer ‘eu batizo convertidos’”.
Hegazy falou que reações como essas fazem os convertidos se sentirem marginalizados.
“É preciso entender que a Igreja trata os convertidos como cidadãos de segunda classe. O único ato heróico que eles puderam fazer foi me batizar secretamente” – contou Hegazy, que teve que lutar para conseguir um certificado de batismo, como muitos outros convertidos. “Você pode imaginar como um convertido se sente? Podemos acusar os convertidos de serem discriminadores ou sectários se eles quiserem estabelecer suas próprias igrejas?”
Os convertidos são atacados de todas as frontes da sociedade egípcia, contou Hegazy. “O governo é islâmico, a sociedade é islâmica e a Igreja é fraca”, disse ele. “Os convertidos estão presos no meio de tudo isso, entre as garras do governo e da sociedade.”
Uma pequena ajuda
Hegazy e outros ativistas pelos direitos religiosos acreditam que casos particulares como o dele ou o de Maher El-Gohary, aberto no mês passado, não podem ganhar sozinhos os direitos legais para os convertidos que desejam se tornar cristãos oficialmente e ser aceitos na sociedade.
“Eu não acredito que meu caso será resolvido” – afirmou Hegazy. “Não sou pessimista, mas se lidarmos com um caso particular, não poderemos conseguir nada. Em vez disso, devemos tratar de questões mais amplas e discutir a conversão como um caso de âmbito maior, pois há muitos convertidos sendo perseguidos”.
Como outros ativistas, Hegazy falou que se os convertidos egípcios que moram fora e dentro do Egito moverem um processo conjunto terão mais força. Mas precisam de um apóio maior dos grupos de direitos humanos, que não estão fazendo muita pressão pelos casos dos convertidos, segundo ele.
“Não consigo entender como existem tantas organizações de direitos humanos, e algumas cristãs, e nenhuma está tomando providências” – disse.
Hegazy sugeriu que as organizações de direitos humanos deveriam advogar publicamente uma lei que apoiasse a liberdade de conversão, incluindo comitês para monitorar os desenvolvimentos. Se uma lei como essa estivesse em vigor, disse ele, o governo egípcio iria parar de usar as reações fundamentalistas do islã como uma desculpa para não exercer justiça.
“Desta forma, o governo não pode dizer ‘nós nãopor causa do fundamentalismo; isso entristecerá nossa sociedade’, pois haverá uma lei em vigor” – afirmou Hegazy.
Além disso, disse ele, os convertidos também devem lutar contra a falta de ação das organizações de direitos humanos.
“O problema é que nós estamos numa batalha contra a Igreja, a sociedade, nossas famílias” – disse ele. “Portanto, não precisamos de uma batalha extra com as organizações de diretos humanos.”
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