Gritando insultos ao cristianismo, um muçulmano turco puxou e apontou uma longa faca de açougueiro em direção a dois padres e um grupo de adolescentes, na noite de 11 de março, em uma igreja católica latina em Mersin, ameaçando-os e às suas famílias.
Em uma parada de 30 minutos na cidade na costa sul da Turquia, Erdal Gurel entrou no convento da paróquia da Igreja Católica Saint Antoine no momento em que 25 dos jovens da igreja estavam ensaiando para a peça da Páscoa.
"Estava no meu escritório por volta das 19h30 quando escutei alguém gritando. Então olhei para fora no corredor para ver o que estava acontecendo", contou o padre Handi Leylek mais tarde em depoimento à polícia.
O padre Handi, um cidadão turco e irmão na ordem dos Capuchinhos, disse que ofereceu ajuda ao estranho. Mas ele insistiu em linguagem pesada: "Quero ver o padre gordo e barbudo". Então, ele começou a praguejar e "falar coisas sem sentido", disse o padre Handi.
Mandando os jovens amedrontados retornarem e trancarem-se na sala de ensaio, o padre tentou conversar com Gurel e pediu para ele entrar. Como ele começou a gritar insultos e recusou-se a sair, o padre foi até o telefone do corredor para ligar para a polícia.
Antes que o padre terminasse de ligar, os jovens da igreja gritaram tentando adverti-lo. Ele se virou e viu o intruso se aproximar dele, brandindo uma faca de açougueiro de 75 centímetros que estava escondida atrás de suas costas.
"Ele começou a me ameaçar com a faca e a amaldiçoar o cristianismo e a igreja", disse o padre Handi.
Nesse momento, o padre italiano Roberto Ferrari saiu da cozinha e entrou na sala. Gurel virou-se e correu na direção dele, balançando a faca e gritando em termos vulgares: "Você não é um ser humano! Eu violarei sua mãe, suas irmãs, seus filhos".
Quando Gurel se distraiu, o padre Handi escapou pela porta e correu algumas quadras até a delegacia de polícia mais próxima.
A distorção da mídia
Nesse ínterim, o agressor quebrou o vidro da porta da sala de ensaios, que estava trancada, e conseguiu abri-la com a ajuda da faca. Quando ele começou a perseguir os jovens, eles fugiram para os banheiros, para o segundo andar e até para o telhado da igreja.
Após desistir da perseguição, Gurel retornou para o andar debaixo e começou a revistar as jaquetas e as mochilas dos adolescentes. Ele tinha acabado de pegar o telefone celular de um dos jovens quando o padre Handi retornou com vários policiais cinco minutos depois. Embora Gurel tivesse argumentado e resistido às ordens da polícia durante 15 minutos, ele finalmente se acalmou e se rendeu. Neste momento, mais uma dezena de policiais e vários jornalistas chegaram à igreja.
As primeiras reportagens sobre o incidente em canais de televisão locais e em jornais regionais nos dois dias seguintes ao incidente mencionaram o agressor simplesmente como um potencial ladrão que puxou uma faca quando confrontado por um padre.
De acordo com um artigo de 15 de março, publicado no jornal diário nacional "Milliyet", o acusado tem dezenove anos e foi condenado anteriormente por quatro roubos. A polícia registrou Gurel com 22 anos, proveniente da cidade de Batman.
Ao mesmo tempo, a imprensa turca e os canais de televisão privados têm promovido um crescente nível de antagonismo contra o cristianismo nos últimos 18 meses. Algumas autoridades governamentais abertamente encorajaram essa enxurrada de propaganda anticristã, alegando que os cristãos locais e os missionários estrangeiros têm motivos políticos escondidos para converter os 70 milhões turcos da Turquia ao cristianismo e destruir o islamismo.
Uma das emissoras de TV que noticiaram o incidente de Mersin enfatizou os gritos do suspeito, ouvidos pelos jornalistas, enquanto ele era colocado em um carro da polícia durante a cena: "Você está fazendo sexo aqui!" Um videoclipe dos adolescentes presentes durante o ataque insinuava que eles estavam envolvidos em prostituição sob os auspícios da igreja.
A resposta da igreja
A fim de corrigir esses mal-entendidos, os líderes das paróquias de Mersin convidaram os jornalistas nacionais e locais, os grupos de direitos humanos e representantes dos partidos políticos para uma entrevista coletiva em 14 de março.
Depois de dar aos 34 convidados uma explicação detalhada do incidente, o padre Handi chamou atenção particular para a identidade turca da congregação católica de Mersin. "Todas as pessoas que vocês vêem aqui na nossa comunidade são filhas desta terra", disse ele. "Elas não são um grupo de estrangeiros trazidos para cá".
Como autênticos cidadãos turcos, disse o padre, todos eles estavam trabalhando conscientemente para a paz e o bem-estar do país e seu próprio.
Ao declarar que incidentes violentos contras as igrejas cristãs recentemente multiplicaram-se, o padre Handi observou que esses ataques estavam sendo realizados por estranhos - indivíduos desconhecidos da comunidade. Questionando o motivo de tais ataques, o padre perguntou "Há outras pessoas por trás desses ataques? O propósito deles é intimidar a igreja, amedrontá-la e provocar terror àqueles que participam, a fim de dividir e separar nossa igreja do resto da nação?".
Após a entrevista coletiva, um canal de TV local chamado San prontamente corrigiu as informações incorretas transmitidas em edições anteriores. No dia seguinte, o jornal regional "Imece" e, pelo menos, um outro jornal diário também publicaram todo o texto da declaração do padre Handi nas páginas de capa.
Ataque anterior
Permanece obscuro se Gurel ainda está sob custódia policial, já que um canal de televisão divulgou sua libertação na segunda-feira. Contudo, o padre Handi contou que a polícia lhe havia informado, em 15 de março, que o suspeito fora detido por acusações criminais registradas pelo procurador local.
"Mas hoje um jornalista recebeu informações do mesmo escritório policial de que Gurel havia sido libertado!", disse o padre Handi. "Então, nosso advogado está esperando para receber a palavra oficial do escritório do procurador sobre a situação de Gurel".
Em um ataque anterior, na paróquia St. Antoine, em dezembro último, um jovem desconhecido arrombou duas portas do convento e forçou a entrada às quatro horas da madrugada, exigindo falar com o padre.
Apesar de estar desarmado, o jovem queimou alguns livros da biblioteca da paróquia antes que os padres ouvissem seus gritos e viessem falar com ele. Quando os líderes locais vieram para levá-lo até a delegacia de polícia para interrogatório, ele os acompanhou sem qualquer resistência, contaram os representantes da igreja.
O padre Handi disse que a igreja encontrou pouca oposição dos moradores de Mersin. "Pelo contrário", disse ele, "o povo de Mersin apóia as igrejas neste lugar. Nossa igreja faz parte da cidade".
Estabelecida há 150 anos, a paróquia St. Antoine atualmente tem uma comunidade de 400 fiéis de língua turca.
Após o assassinato do padre católico Andrea Santoro, em 5 de fevereiro, em Trabzon, o padre Hansi disse que a igreja em Mersin recebeu inúmeras chamadas telefônicas "por pelo menos 15 dias" e os cidadãos locais expressavam sua tristeza e apoio à comunidade católica.
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