Como conseqüência da nova guerra declarada entre o governo do Sri Lanka e o grupo "Tigres de Libertação da Pátria Tamil" (LTTE, sigla em inglês), as igrejas do nordeste do país têm se tornado mais uma vítima de guerra.
O LTTE tem lutado por um território tamil independente desde 1980. Enquanto ambas as partes do conflito dizem que estão comprometidas com um acordo de cessar-fogo desde 2002, os analistas dizem que a situação atual está mais próxima a uma "guerra não-declarada".
Desde que as hostilidades do ultimo ano foram retomadas, igrejas na península de Jaffna têm providenciado ajuda a centenas de desabrigados internos, provocando ataques de retaliação pelo exército do Sri Lanka.
"Alguns se perguntam se os ataques às igrejas são somente uma coincidência ou uma tentativa do governo em alertar o clero a não dar proteção a essas pessoas indefesas", disse ao Compass um contato que preferiu permanecer anônimo.
Essa mesma fonte disse que aqueles que defendem a causa desses desabrigados são freqüentemente silenciados pela intimidação ou pela "eliminação", esta geralmente em forma de desaparecimentos inexplicáveis.
"A igreja, incapaz de permanecer como testemunha silenciosa, tem feito contato com o mundo lá fora", acrescentou a fonte. "O governo do Sri Lanka tem registrado isso e aparecido para tentar, direta e indiretamente, silenciar essas vozes através de seqüestros e algumas vezes, eliminação de líderes da igreja".
Mortes e desaparecimentos
Há apenas um mês, em 13 de janeiro, membros das forças da segurança do Sri Lanka, atiraram no pastor Nallathamby Gnanaseelan. O pastor, de 38 anos e pai de quatro filhos, deixou a Missão Tamil da Igreja de Jaffna.
Na manhã em que ele foi morto, Nallathamby havia deixado sua esposa e filha no hospital local e se dirigido à igreja, onde alguns membros haviam se reunido para orar. Antes que chegasse à igreja, entretanto, ele foi baleado na cabeça e no estômago. Sua Bíblia, RG e motocicleta foram levados, e ele foi deixado ferido na rua.
As forças de segurança disseram inicialmente que Nallathamby foi baleado por carregar explosivos, mas depois disse que na verdade ele foi baleado por não ter parado ao receber tal ordem.
Os cristãos locais disseram que a acusação inicial foi uma tentativa deliberada para difamar o pastor, que era um membro respeitado da Aliança Cristã Evangélica Nacional em Jaffna e que não estava envolvido em nenhuma atividade política.
O padre Thiruchchelvan Nihal Jim Brown (popularmente conhecido como frei Jim Brown) e seu assistente, Wenceslaus Vinces Vimalathas, encontraram o mesmo destino. Ambos desaparecerem em 20 de agosto de 2006, de acordo com as informações da mídia local.
Testemunhas disseram que viram os dois religiosos na vila de Allaipiddy, na ilha de Kayts, da península de Jaffna, por volta das 14 horas do dia 20 de agosto, sendo seguidos do porto da marinha de Allipiddy por seis homens armados em motocicletas. Nenhum dos dois foi visto desde então. Comandantes da marinha negaram perseguir esses dois homens.
Brown e Vimalathas tinham ido visitar a igreja de Brown na paróquia de São Felipe Néri. A igreja e a vizinhança predominantemente católica haviam sido abandonadas uma semana antes, após a igreja ter sido bombardeada no dia 13 de agosto.
Um tiroteio aconteceu no dia 13 de agosto entre os oficiais da marinha e o LTTE em Allaippidy, deixando 15 civis mortos e ao menos 54 feridos na troca de tiros. Muitos moradores das vilas procuraram abrigo na igreja de São Felipe Néri. Quando o tiroteio acabou, Brown ajudou cerca de 800 pessoas a serem transferidas para a igreja de Santa Maria, na cidade vizinha de Kayts. Algumas testemunhas disseram que Brown se ajoelhou no porto da marinha para pedir uma transferência segura para os moradores.
Pouco tempo depois, de acordo com o relato da Anistia Internacional, o comandante da marinha de Allaipiddy, xingou Brown e o acusou de ajudar os Tigres a construir abrigos. Brown, entretanto, disse que os membros da igreja tinham escavado abrigos para se proteger dos bombardeios às dependências da igreja.
Brown havia substituído outro sacerdote, o padre Amal Raj, que tentava ser transferido da igreja de São Felipe Néri após o assassinato de uma família cristã em 13 de maio. Os oficiais da marinha ameaçaram a vida de Raj após ele ter protestado contra o tiroteio.
As forças de segurança já haviam atacado Alaipiddy e duas outras vilas majoritariamente católicas, Vankalai e Pesalai, anteriormente, no dia 17 de junho de 2006. Durante o ataque, uma granada foi atirada dentro da igreja em Pesalai, onde 200 pessoas estavam abrigadas. Uma pessoa morreu e 47 ficaram feridas.
'Nós estávamos todos dentro da igreja quando os homens da marinha chegaram e abriram fogo. A granada foi jogada por uma janela", Mariyadas Loggu declarou à "Associated Press".
Civis costumam se abrigar em igrejas, enxergando-as como local seguro; em algumas vilas, moradores que tem medo de ataques aéreos dormem todas as noites na igreja local.
Padres católicos de outra região da península de Jaffna confirmaram as mortes de muitos civis através de ataques aéreos, bombardeios e tiroteios - muitos deles promovidos pelas forças de segurança.
Civis são alvo tanto do exército quanto dos rebeldes do LTTE - com soldados prendendo e interrogando centenas de pessoas, enquanto os rebeldes têm torturado e matado famílias inteiras, suspeitas de apoiar o governo.
Em setembro de 2006, mais de 200 mil pessoas foram desalojadas no nordeste do país, com escolas, casas e templos sendo destruídos indiscriminadamente.
Linhas turvas
Lideres da igreja também reclamaram dos bloqueios do governo em Jaffna, cortando alimentação básica e suplementos médicos aos civis afetados pelo conflito, mas não envolvidos nele diretamente.
"Numa guerra civil, as linhas ficam turvas", disse Godfrey Yogarajah, presidente da Aliança Nacional Cristã Evangélica do Sri Lanka. Ele ressaltou que esforços pela liberdade religiosa estão intrinsecamente ligados ao clima geral de abuso dos direitos humanos.
A entidade pede uma intervenção urgente das Nações Unidas: "Milhares de pessoas estão sendo arbitrariamente presas, torturadas ou mal tratadas. Nós pedimos à comunidade internacional que levante sua voz e evite o massacre de inocentes neste país. É de extrema necessidade uma missão das Nações Unidas que monitore os direitos humanos no Sri Lanka. O mundo não pode permanecer espectador enquanto a situação se deteriora, e enquanto, todos os dias, pessoas têm pagado com suas próprias vidas".
Ataque a igrejas não são novidade no Sri Lanka. Desde 2002, grandes multidões - geralmente lideradas por monges budistas - têm promovido uma série de ataques às igrejas no sul. O clero budista também tem feito campanha para uma lei anticonversão, nos moldes das leis na Índia, para restringir o crescimento de igrejas cristãs.
Dois projetos de lei anticonversão estão em andamento no Parlamento, embora a retomada da guerra civil tenha causado uma pausa temporária na campanha.
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